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Foto do escritorPsicóloga Cláudia Yaísa

Reflexões sobre a dislexia


Em seu trabalho intitulado "Dislexia existe? Questionamentos a partir de estudos científicos", a médica e professora da Unicamp Maria Aparecida Affonso Moysés, expõe algumas considerações importantes acerca da dislexia. Primeiramente é válido compreender a definição oficial aceita pela Associação Internacional de Dislexia (AID) e pela Associação Brasileira de Dislexia (ABD), que a define como sendo uma dificuldade de aprendizagem de origem neurológica, caracterizada por um déficit com a fluência correta na leitura e na habilidade de decodificação e soletração.


A autora explica que a ciência médica tem afirmado que a dislexia é uma doença neurológica, mas até o momento não conseguiu comprovações científicas apuradas que assumam tal posição. A crítica levantada por Moysés evidencia que o diagnóstico é realizado exclusivamente por meio de leitura e escrita, mas tais dificuldades "vão aparecer em toda pessoa que tiver dificuldade com leitura e escrita." Assim, é possível pensar que toda pessoa com um déficit na alfabetização apresentará essas dificuldades, ou então, se dermos um texto em inglês para um bom leitor norte-americano ele será considerado normal, mas um texto em espanhol para o mesmo leitor poderá resultar em um indício de dislexia. Isso pode ser explicado pela forma incoerente que os diagnósticos estão sendo realizados.


O fato é que se a dislexia fosse considerada um problema no processo de alfabetização, o instrumento para diagnóstico deveria estar relacionado à leitura e escrita. No entanto, considerar uma doença neurológica analisando apenas leitura e escrita, é algo que está fora do discurso científico. "Eu não posso usar um instrumento feito para quem sabe ler, para avaliar quem não sabe ler e, dizer que quem não souber ler tem uma doença neurológica, um distúrbio". Desse modo, corre-se o risco de perder de vista a criança e o adolescente por trás de um diagnóstico de uma doença não comprovada, ou seja, perder o sujeito que existe em sua singularidade e complexidade.


É fato que a neurologia possui outros instrumentos para evidenciar a existência da dislexia, mas essas justificativas não esclarecem muita coisa. Têm-se então várias explicações: alteração genética, alterações anatômicas, alterações funcionais captadas por neuroimagem. Em todos esses casos não há uma convergência entre os autores, cada grupo sustenta uma ideia diferente e nenhum conseguiu de fato explicar, seguindo um rigor científico adequado e coerente.


Segundo Moysés, os exames de neuroimagem são realizados por aparelhos sofisticados e que contribuíram imensamente para o avanço da medicina. O problema não é o aparelho, mas o uso do mesmo para o diagnóstico de dislexia. Para que o exame consiga detectar a área do cérebro que entra ou não em atividade na leitura, é preciso que a área seja ativada por meio de textos dados à pessoa, ou tarefas em que se usa a linguagem escrita.


"Voltamos à questão inicial: como eu o diferencio de um analfabeto? Não existe essa resposta." Além de tudo que foi exposto, a autora citada enuncia ainda que por trás de um diagnóstico de dislexia e TDA/H, encontra-se os interesses da indústria farmacêutica. "[...] 11% dos médicos paulistanos reconhecem já terem recebido brindes valiosos de indústrias farmacêuticas."


Essa discussão é relevante porque estudos divulgam que cerca da metade das pessoas diagnosticadas com dislexia, também recebem diagnóstico de TDA/H. A preocupação de Moysés se refere ao crescente número de crianças no Brasil e no mundo fazendo uso de Ritalina e Concerta, e não é novidade que em certos casos de adultos que param de tomar o medicamento, surge o aumento da incidência de uso de cocaínas, pois se sabe que o mecanismo de ação da Ritalina é o mesmo da anfetamina e cocaína. Somam-se a isso as reações adversas do medicamento, bem como o risco para o sistema cardiovascular, entre outros.


Moysés tenta alertar nesse texto, a importância da defesa dos direitos da criança e do adolescente, inclusive "o direito de não tomar um remédio que pode matar". O direito que garante o aprendizado às crianças, e que a escola possa avaliar as possibilidades e necessidades de acordo com a individualidade de cada uma, ajudando-as a superar seus limites. Nesse contexto, considera-se a dislexia para além de um distúrbio neurológico, mas como influenciada pelo contexto social, histórico, cultural e geográfico em que nos situamos.


A leitura das ideias expostas pela médica Moysés pode em um primeiro momento chocar e até causar estranhamento. Minha intenção não é a de que desacreditemos em uma explicação em prol de outra, mas que possamos refletir outras possibilidades de se pensar a dislexia e os problemas de aprendizagem, como estando inseridos em um contexto social maior que os influencia.


Muitas crianças estão sim, sendo amordaçadas indevidamente por medicamentos que oferecem respostas "milagrosas" ao mau comportamento, indisciplina e agitação. Mas para que? Para quem?


Acredito que esse seja tema para outra reflexão. Realizei aqui uma breve apreciação dos argumentos proferidos pela autora supracitada, por isso convido àqueles que quiserem aprofundar o entendimento exposto, para que leiam na íntegra o artigo base.


Referências MOYSÉS, Maria Aparecida Affonso. Dislexia existe? Questionamentos a partir de estudos científicos. Disponível em:. Acesso em: 09 de abr 2012.



Psicóloga Cláudia Yaísa

CRP 06/111120


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