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  • Foto do escritorPsicóloga Cláudia Yaísa

O adolescente antissocial


Sabe-se que a adolescência atual não é um período fácil de lidar, mas essa concepção se agrava quando o jovem é agressivo, apresenta comportamentos antissociais e condutas desviantes. Refiro-me aos adolescentes que cansam os pais e a escola, aqueles que “dão trabalho”, mentem, desrespeitam professores, faltam às aulas, enfrentam as autoridades, saem de casa e nos casos extremos, furtam, usam drogas e tornam-se delinquentes.


No imaginário social permeia a ideia de que a adolescência é uma fase problemática em que os jovens que apresentam atos sociais desviantes possuem má índole, falta de caráter ou alguma vingança difícil de ser controlada por qualquer pessoa. Tal pensamento estereotipado é preconceituoso e acaba por reduzir o problema ao próprio adolescente ou ao meio em que este vive (família desestruturada, periferia), não vendo solução ou possibilidade de mudança.


Convido o leitor a ampliar essa visão a partir de um retorno ao percurso do desenvolvimento humano. Quando a criança nasce precisa desfrutar de um período de dependência absoluta da figura materna ou substituta, em que mãe e filho estabelecem uma relação próxima de entrosamento. Nesta etapa o bebê não compreende o mundo ao seu redor, vive apenas voltado para suas sensações de prazer e desprazer, fome, saciedade, sono e desconforto. Com o passar do tempo, naturalmente a criança adquire maior estruturação em seu desenvolvimento e a mãe passa a inserir pequenas falhas, as quais apontam para o bebê a diferenciação entre ele, a mãe e o mundo externo.


O que acontece em alguns casos é que a criança pequena vivencia uma sucessão de falhas provenientes das figuras parentais em um momento ainda prematuro de seu desenvolvimento, em que não internalizou aspectos protetores e de segurança em si, necessitando de protetores e referenciais externos (nos adultos). Nessa situação ela se sente desprovida, angustiada, desamparada por perceber que o quadro de referência em sua vida não a cuidou, nem a conteve. Essas faltas ficam registradas no psiquismo do infante que mais tarde irá buscar estabilidade e controle externos, fora de casa, nos avós, tios, vizinhos, escola e amizades.


A falha inicial é chamada de privação emocional e provoca um bloqueio no desenvolvimento emocional saudável do indivíduo. Em decorrência dessa eventualidade, observa-se por parte da criança a esperança inconsciente de que o meio se dê conta da falta e repare a fenda provocada pelo dano. Nesse caso o indivíduo procura formas de obrigar o meio (família, escola, sociedade) a cuidar, tolerar, olhar e compreender o mesmo. Observa-se, então, a criança ou o adolescente que não encontrando esse olhar em casa, procura de todas as formas chamar a atenção na escola ou na rua, sendo esse o único meio encontrado para que o percebam.


Em algumas situações a própria família ou responsáveis pela criança/adolescente percebem a falha e organizam meios de compensá-la, fazendo uso de controle por alguém que a ame ou o denominado amamentar mental, conduzindo ao restabelecimento maturacional. No entanto, se isso não acontece o indivíduo pode prolongar-se em uma constante prisão emocional e na adolescência partir para a tendência antissocial com comportamentos delinquentes. Assim, a autoridade máxima a que o jovem inconscientemente incita a contê-lo é a polícia e o juiz, diante dos quais o indivíduo é levado a responder judicialmente pelos atos cometidos. Vale ressaltar que, perante tais figuras, supõe-se que o adolescente procura a função paterna para impor a ordem e a lei.


Vale notar que o adolescente com tendência antissocial experienciou no início da vida momentos prazerosos com as figuras parentais e depois ficou desprovido desse aparato por uma privação emocional, buscando o retorno àquela época. No entanto, há aqueles que vivenciaram significativas perdas e faltas desde o começo de suas relações, podendo se tornar pessoas frias, indiferentes, apáticas, com características depressivas e psicóticas.


O assunto aqui proposto é delicado e merece atenção de pais e professores. Pretende-se por meio dessa reflexão abrir possibilidades para que os jovens com condutas antissociais tenham a chance de escaparem do estereótipo a eles dado, resgatando suas integridades físicas e emocionais para construírem uma história diferente.


FONTE CAMPISTA, V. do R. Adolescentes fora-da-Lei: O desejo e (m) cena. Vértices, Rio de Janeiro, v. 2, n. 6, p. 117-130, mai/ago, 2010. PONTES, M. L. S. A hora H: o imaginário coletivo de profissionais da saúde mental sobre a adolescência. Dissertação (Mestrado em Psicologia Profissão e Ciência), Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Campinas, São Paulo, 2011. ROTONDARO, D. P. Os desafios constantes de uma psicóloga no abrigo. Psicologia Ciência e Profissão, Brasília, v. 22, n. 3, set, 2002. SÁ, A. A. de. Delinqüência infanto-juvenil como uma das formas de solução da privação emocional. Psicologia - Teoria e Prática, São Paulo, v.3, n.1, p. 13-22, 2001. VILHENA, J. de; MAIA, M. V. C. M. Agressividade e violência: reflexões acerca do comportamento anti-social e sua inscrição na cultura contemporânea. Revista Mal-estar e Subjetividade, Fortaleza, v. II, n. 2, p. 27-58, set, 2002. WINNICOTT, D. W. O ambiente e os processos de maturação: estudos sobre a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982. WINNICOTT, D. W. Privação e delinquência. São Paulo: Martins Fontes, 2002.



Psicóloga Cláudia Yaísa

CRP 06/111120 

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